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Queda de Evo é ‘meia-felicidade’, diz filha de senador que fugiu para o Brasil

Publicado em: 15/11/2019

por Rubens Valente | Folhapress

Queda de Evo é 'meia-felicidade', diz filha de senador que fugiu para o Brasil

Foto: Reprodução / Reuters

Para uma das filhas do ex-senador boliviano Roger Pinto Molina (1960-2017), a advogada Denise Pinto Bardales, 29, a queda do agora ex-presidente Evo Morales é uma “meia-felicidade” e tem “sabor amargo”.

Opositor de Evo, Molina foi trazido ao Brasil às escondidas em 2013 por um diplomata brasileiro e acabou morrendo em Brasília, quatro anos depois, em decorrência de um desastre em uma aeronave experimental.

Denise é uma das 12 parentes de Molina que residem desde 2012 no Brasil na condição de refugiados, residentes ou já nascidos no país. Vivem com ela, todos em Epitaciolândia, no Acre, sua mãe Blanca, 59, duas irmãs e sobrinhos.

“A gente está feliz por todas as famílias [refugiadas] que vão poder se reencontrar. Mas a gente fica muito triste porque meu pai foi embora e não conseguiu, em primeiro lugar, limpar o nome dele, porque não é nenhum bandido ou corrupto, foi o governo que o perseguiu. E principalmente porque era o maior sonho dele conseguir regressar à sua terra. Ele ficou muito anos sem rever amigos, parentes, gente que até morreu. Para nós, é doloroso pensar que só faltavam dois anos para ele conseguir voltar.”

Em 2018, Denise conseguiu levar as cinzas do pai para um cemitério na cidade boliviana de Cobija. Na lápide, a família mandou escrever: “Morreu no exílio… livre”.

Segundo Denise, vivem hoje em vários países cerca de 1,3 mil bolivianos considerados refugiados por algum tipo de perseguição política movida durante a gestão de Evo Morales. Ela disse que grande parte vive no Brasil e muitos agora falam em voltar à Bolívia.

O caso de Molina teve grande repercussão no Brasil em razão do modo pelo qual ele entrou no país. Crítico de Evo no Parlamento, ex-governador de Pando e senador por um partido conservador, Molina afirmou ser vítima de perseguição política.

A princípio, em 2012, refugiou-se na embaixada do Brasil em La Paz. Ao mesmo tempo, suas três filhas e sua mulher rumaram para o Acre.

O plano era conseguir rapidamente um asilo político do governo brasileiro para se mudar e viver no Brasil. A espera, contudo, durou mais de 15 meses sem resposta.

Cansado de aguardar uma definição do governo Dilma Rousseff (2011-2016), o diplomata Eduardo Saboia e dois militares brasileiros colocaram Molina num carro e depois num avião até chegar a Brasília, em uma fuga sigilosa que durou um dia e meio.

A crise gerada pela viagem culminou na destituição do então chanceler brasileiro, Antonio Patriota.

Em Brasília, Molina se estabeleceu e passou a ter aulas de aviação. Em 2017, uma aeronave experimental, semelhante a um ultraleve, que ele pilotava caiu em Luziânia (GO). O ex-senador foi internado com múltiplos ferimentos num hospital em Brasília, mas morreu quatro dias depois.

A trágica história de Molina é pontuada por outro desastre de avião. Ele era sogro de Miguel Quiróga, o piloto do avião que caiu na Colômbia com a delegação do time de futebol Chapecoense em novembro de 2016.

Segundo a família do ex-senador, quando Evo chegou à Presidência, em 2006, mantinha uma boa relação com Molina. Ambos haviam sido deputados federais e até jogado futebol juntos. Com o passar do tempo, contudo, entraram em rota de colisão.

Numa entrevista à Folha de S.Paulo, em 2013, Molina disse que o seu “linchamento político” começou a partir da influência de Cuba e Venezuela em assuntos internos da Bolívia.

O então senador foi acusado de cumplicidade em um massacre de camponeses. Molina, que sempre disse ser inocente, foi alvo de 22 processos sob várias acusações. Disse ter recebido ameaças de morte.

Com Molina refugiado na embaixada brasileira, houve ameaças contra outros membros da família, incluindo Denise, que também passou a ser acusada.

“Tinha contra mim um processo penal porque supostamente eu tinha tentado assassinar alguém do governo. Eu, com 22 anos, tinha tentado assassinar alguém. Era uma perseguição penal. Eles iam à minha casa, deixavam intimação, eu tinha que me apresentar à polícia. Eu estudava na faculdade e sempre tinha um carro preto me seguindo. Teve dias em que eu fui dormir na embaixada com meu pai porque tinha medo. Nós não tínhamos dinheiro para pagar segurança privada”, disse Denise.

As perseguições, segundo Denise, continuaram mesmo após a morte de Molina.

“Eles sentenciaram meu pai a cinco anos de cadeia mesmo ele estando morto. Se você cometeu um crime penal, os parentes não podem herdar isso. Mas eles sentenciaram meu pai, ele estando morto, e ‘passaram’ a pena para a gente. Eles estão cobrando US$ 13 milhões da nossa família. São coisas absurdas. A gente acha que é porque eles não queriam que a gente tivesse algum tipo de carreira política lá na Bolívia. Então todos os processos contra meu pai foram ‘passados’ para nós.”

A queda do veículo que levou à morte de Molina também continua um mistério para a família.

Extra-oficialmente, segundo Denise, eles receberam a informação de que houve um problema no “difusor de combustível” do aparelho e que o caso continua sendo investigado pela Polícia Federal, mas nunca puderam ter acesso a algum relatório oficial.

A reportagem confirmou que no registro oficial das investigações da FAB o caso continua em andamento.

Denise disse que acompanha todo o noticiário sobre o que se passa na Bolívia. Ela reconhece que houve manifestações que lhe desagradaram, como a retirada, por policiais, da Whipala em seus uniformes, a bandeira que representa o movimento indígena na Bolívia.

Mas diz que os líderes do movimento já se manifestaram oficialmente contra o racismo e as manifestações anti-indígenas.

“Eu acho que é um momento-chave para que todos os bolivianos consigam se reconciliar. Eu sinto, independentemente de toda a perseguição que minha família teve, que o MAS [Movimento para o Socialismo, partido de Evo] veio com muito ressentimento, ele fez uma separação na Bolívia muito criminosa. É um momento agora em que todo mundo está tentando se reconciliar”, diz a advogada.

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